14 de setembro de 2022

dois parvos

Agora tenho dois cães. 

Despachei a Clarinha, a gata que tínhamos, para uma família muito melhor que a nossa no departamento dos gatos. A Clarinha tinha uma personalidade demasiado grande para esta casa e deixava de nos falar quando ficávamos uns dias fora, o que acontecia amiúde. Além disso, o sistema digestivo dela não tinha memória e passava os dias ou a comer ou a miar a pedir comida. O tempo que lhe restava passava a ignorar-nos. 

A última vez que vi uma foto dela já não era uma gata, tinha se transformado num texugo. 

Ficámos uns tempos sem animais cá em casa, além das minhas três cabras adultas. 

Um dia, era feriado, e tive a ideia triste de ir a um canil “só ver”. Até tive que pesquisar no Google por canis aqui na zona e encontrei o Arronches Adopta. Lá fomos. Com repetidos avisos às criaturas que íamos “só ver”.  Pois. 

Assim que lá cheguei, dei de caras com o Pintas, mas a Patrícia nem me deixou aproximar, que ele era muito destruidor e só dava para a malta do trail. Tinha que ser cansado. 

Tentou vender-me aqueles cães cremes dos velhos. Sabem? Até o nome era ridículo. Alf. 

Claro que o Tiago ficou logo cheio de compaixão, que não era assim tão foleiro e que a cauda era muito engraçada e uma série de outros argumentos que nem ouvi. 

Mais à frente estava a Noa. Acabada de devolver de uma adopção que correu muito mal. Ainda tinha o pelo todo foloso, mas atirou se a nós a pedir festas e mimos e nós encantámo-nos. (Mais tarde, viemos a descobrir que ela faz isso a toda a gente e não éramos especiais. É mesmo uma Maria vai com todas.)

Negociámos com o Tiago e fomos passear a Noa e o tal do Alf, que se revelou desinteressante. 

Passámos a ir passear a Noa mais vezes e passei a levar o António (sobre o qual falarei noutra ocasião), uma vez que ele era corredor e assim a Patrícia deixava passear o Pintas. 

Long story short, a Noa foi adoptada um mês depois. Em Abril de 2019. Estar prestes a ter um cão é muito parecido com estar prestes a ter um filho. Toda a gente se mete e oferece opiniões e conselhos não solicitados. Chegámos a temer o pior. Aquilo parecia mais uma prisão do passeio à rua do que um cão. Imensas regras, horários e mariquices que nos pareciam completamente desnecessárias. Afinal, um cão é um cão, certo? 

A Noa veio e adaptou se aos nossos horários, até porque não teve outro remédio. Passeia quando acordamos e já vai com sorte. Tem comida sempre à disposição, porque ou era isso ou era bem capaz de ninguém se lembrar se já tinha comido ou não. 

E passou a ir connosco para todo o lado. É a cadela mais parvalhona do mundo todo. Responde por Noa, Noémia, Rantanplan, Doutora, Princesa, Preta e tudo o mais que entendamos chamar-lhe. Abana sempre a cauda e está sempre feliz. No fim-de semana que a adoptámos, fomos passear ao Luso e levámo-la. Passou de estar presa a uma árvore por um arame para abanar a cauda no Buçaco! Ficou logo ensinada sobre a vida nesta casa.

Faltava o Pintas e seis meses depois tive que aldrabar o António para finalmente dar o passo de o adoptar. Disse-lhe que o iam buscar nesse fim-de-semana e ele entrou em pânico e ligou à Patrícia a pedir pamordedeus que não o deixasse ir embora que ele perfilhava-o.

Afinal o Pintas só queria mesmo mimo. Se correr fica feliz, mas gosta mais de ser o bebé cá de casa. É imensamente parvo e a Mia diz que ele é o Jason do The Good Place. Tendo a concordar. 

Actualmente, moram os dois cá em casa e vivem onde nós estivermos. Habituaram-se a fazer muitos quilómetros e a estar connosco, seja lá onde isso for. E em que condições. Já dormimos os quatro no carro, num desses passeios mais livres que fazemos por aí. Mas também já ficaram em muito hotel por este Portugal, e Espanha, fora. Outras vezes ficam com os tios que vamos arranjando ou sozinhos em casa, esperando até de madrugada que cheguemos para o passeio. Aprenderam a confiar, sabem que voltamos sempre, por isso vivem tranquilos.

São os dois completamente parvos. É como ter dois putos de quatro anos que só têm ideias tristes. 

Uma das coisas preferidas da Noa é andar de elevador e ver as portas a passar à medida que aquilo sobe. Só para verem o nível. 

E todas as pessoas, que foram muitas, que vaticinaram que íamos ser péssimos donos e que os cães não iam durar cá muito tempo, enganaram se redondamente.



(O momento em que conheci a Noa ficou registado.)



https://drive.google.com/uc?export=view&id=1jZ3khKhxQ8mkhOtmt4rYydszF6HE6TVF




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