Aqui há uns tempos um amigo meu disse-me que quando vê alguém como eu a perder o encantamento é quando deixa de acreditar que o mundo pode ser melhor. Mas o problema é que eu já não acredito que o mundo possa ser melhor! Eu já não acredito que tudo não seja apenas um grande e ridículo absurdo.
A última coisa que senti que queria fazer, foi a ida à Grécia, como voluntária. No meio de toda a incerteza que é esta ida, no meio do tudo que é a minha agenda profissional, cheia de coisas que aparentemente são de uma importância extrema e inadiável, dos meus filhos e da nossa vida...no meio disto tudo, eu e a Andreia fomos construindo o nosso projecto. Trocámos milhares de mensagens e montámos a coisa. Ela já esteve na Grécia e tem a experiência desta incerteza. Vai-me dizendo para não me preocupar, vai tudo ganhar forma, vai tudo correr bem. Comprámos os bilhetes de avião e achamos que vamos para o campo de Skaramagkas, que é para onde estão a enviar as pessoas que estão no porto de Piraeus, em Atenas, uma vez que está a ser desmantelado. Dizem. Parece.
Agora temos que ver como conseguimos alojamento, o mais barato possível, porque os nossos custos saem do nosso bolso integralmente e são a viagem, o alojamento, a alimentação e as deslocações que tenhamos que fazer por lá. Andamos tão ocupadas em tentar perceber como vai acontecer, em manter a página do projecto para tentarmos angariar algum dinheiro para montar um centro escolar. Não está fácil. Estamos na silly season e as pessoas acham que os refugiados são uma sub-espécie. Um sucedâneo. Uma mentira. Terroristas. Que eles estão habituados. Os países deles sempre foram estranhos. Esta gente é esquisita. As pessoas acham que esta não é a causa delas, que devíamos apoiar os cães, os gatos, as nossas crianças, os velhos, as árvores, a calçada portuguesa ou a bola de Berlim com creme. Ou estar quietas. Palermices. Solidariedadezinha.
Agora temos que ver como conseguimos alojamento, o mais barato possível, porque os nossos custos saem do nosso bolso integralmente e são a viagem, o alojamento, a alimentação e as deslocações que tenhamos que fazer por lá. Andamos tão ocupadas em tentar perceber como vai acontecer, em manter a página do projecto para tentarmos angariar algum dinheiro para montar um centro escolar. Não está fácil. Estamos na silly season e as pessoas acham que os refugiados são uma sub-espécie. Um sucedâneo. Uma mentira. Terroristas. Que eles estão habituados. Os países deles sempre foram estranhos. Esta gente é esquisita. As pessoas acham que esta não é a causa delas, que devíamos apoiar os cães, os gatos, as nossas crianças, os velhos, as árvores, a calçada portuguesa ou a bola de Berlim com creme. Ou estar quietas. Palermices. Solidariedadezinha.
Não quero ser ingrata. Não quero minimizar as pessoas que já nos ajudaram com palavras, partilhas e dinheiro. Pessoas que nos deram desde 5 a 100 euros, numa conta criada à pressa e com esperança. Que já tem perto de 400 euros, neste momento. Sei quem foram quase todas as pessoas que nos ajudaram. E, por isso, sei que são sempre as mesmas. As que também ajudam os cães, os gatos, as crianças, os velhos e por ai fora. A minha gratidão, admiração e humildade perante estas pessoas é gigante. A bondade é como o amor. Quem a tem nunca a esgota.
Ando tão ocupada, dizia eu, que aproveitei estar ocupada para não ter tempo de ir ver o que se passa na Grécia de verdade. A Andreia anda a tratar dessa parte e essa é a desculpa perfeita para não ir saber. Não ver. Não me envolver. Apenas fazer. Resolver as coisas que há para resolver.
Hoje, a Andreia publicou uma foto que tirou com uma família com quem criou laços quando esteve na Grécia em Maio. E, por mensagem privada, mandou-me uma foto deles, tirada há dois dias, no novo campo onde estão. Convido-vos a olhar para ambas, com algum vagar.
Obrigada por o terem feito.
Dois meses separam estas fotos. Dois meses separam o olhar destas crianças. Reparem na esperança, luz e alegria que existe na primeira foto. Reparem no cansaço e falta de brilho na segunda. A mesma família, mas não os mesmos corações. As mesmas crianças, mas não a mesma infância.
Podia ser eu ali, rodeada pela Mia, pelo Tiago e pela Madalena.
Podia ser um qualquer de nós, a querer que a vida continue a fazer sentido, a querer encontrar o caminho de volta ao caminho.
Mas, até ao momento, nós tivemos sorte.